Construído para Durar: Navegando a Crise e Afirmando o Valor na Indústria Portuguesa de Calçado
Introdução
A indústria portuguesa de calçado, um referencial global de qualidade e mestria artesanal, encontra-se atualmente a navegar uma severa crise económica. Este relatório argumentará que os próprios atributos que definem o seu legado — durabilidade superior, qualidade artesanal e um compromisso com a inovação — não são apenas as chaves para a sua resiliência, mas também formam a base de uma proposta de valor convincente para o consumidor moderno. Numa era de descartabilidade, o “Made in Portugal” representa um investimento tangível na longevidade, tornando o seu custo inicial mais elevado económica e eticamente sólido a longo prazo. Este documento irá explorar a ascensão histórica do setor, desconstruir os pilares técnicos da sua qualidade, analisar a crise contemporânea que enfrenta, defender a sua proposta de valor intrínseca e, por fim, delinear a sua visão estratégica para o futuro.


Secção 1: Um Legado de Reinvenção: A Ascensão do Calçado “Made in Portugal”
A reputação de excelência que o calçado português hoje ostenta não é um acaso histórico, mas o resultado de uma transformação estratégica deliberada, levada a cabo ao longo de décadas. Esta secção traça a evolução da indústria de uma base artesanal e subvalorizada para uma potência global inovadora, demonstrando como a resiliência e a visão estratégica forjaram a sua identidade atual.

1.1 De “Arcaico” a “Vanguarda”: Uma História de Transformação
Há mais de trinta anos, aquando da adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia (CEE), a indústria do calçado era predominantemente rural, artesanal e amplamente percebida como “antiquada” e “arcaica”.
O período entre as décadas de 1970 e 1990 foi marcado por um crescimento exponencial, impulsionado por um modelo de subcontratação (private label) para grandes marcas do centro e norte da Europa.
Esta crise foi o catalisador para uma reinvenção estratégica. A indústria foi forçada a abandonar a competição por preço e a procurar uma nova posição na cadeia de valor, focando-se em atributos onde poderia diferenciar-se: qualidade, design, inovação, flexibilidade e tecnologia.
1.2 A Anatomia de uma Reputação Global
A construção da marca “Made in Portugal” foi um esforço consciente e multifacetado. Um dos momentos mais emblemáticos desta estratégia foi a campanha de comunicação “The Sexiest Industry in Europe”, desenvolvida pela Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e Seus Sucedâneos (APICCAPS). Esta campanha foi crucial para reposicionar a imagem do setor, associando-o a sofisticação, design e modernidade, em vez de apenas a capacidade produtiva.
A evolução do modelo de negócio foi igualmente determinante. Durante décadas, o setor consolidou a sua reputação de qualidade superior através do regime de private label, produzindo para algumas das mais conceituadas marcas internacionais.

Este percurso demonstra uma relação simbiótica entre a produção para terceiros e a criação de marcas próprias. A fase de private label funcionou como um período de incubação essencial, onde as empresas portuguesas não só provaram a sua competência manufatureira, mas também acumularam o conhecimento de mercado e a solidez financeira para lançarem as suas próprias insígnias com sucesso. Hoje, a etiqueta “Made in Portugal” é globalmente reconhecida como um selo de qualidade

1.3 Portugal no Palco Mundial: Uma Visão Geral Baseada em Dados
A transformação estratégica da indústria traduziu-se em números expressivos que a colocam entre os principais players mundiais. Em 2022, Portugal produziu 85 milhões de pares de calçado, consolidando-se como o segundo maior produtor da Europa, ultrapassando a Espanha.
Os principais mercados de destino continuam a ser os parceiros europeus, com Alemanha, França e Países Baixos a liderarem, absorvendo mais de 80% das vendas.
Ano | Produção (Milhões de Pares) | Volume de Exportação (Milhões de Pares) | Valor da Exportação (Milhões €) | Preço Médio por Par (€) | Variação Anual do Valor (%) |
2022 | 85 | 76 | 2.009 | 26,40 | +20,2% |
2023 | N/A | 66 | 1.839 | 27,86 | -8,2% |
2024 (est.) | N/A | 67 | 1.702 | 25,40 | -6,5% |
Q1 2025 | N/A | 20 | 453 | 22,65 | +5,4% |

Secção 2: A Arte da Durabilidade: Desconstruindo a Qualidade Portuguesa
A reputação do calçado português assenta numa base tangível: a qualidade intrínseca do produto. Esta secção oferece o fundamento técnico para o argumento central deste relatório, explicando porque é que o calçado português é durável através de uma análise aprofundada dos materiais, das técnicas de construção e do fator humano insubstituível que é a mestria artesanal.
2.1 A Primazia dos Materiais: Mais do que Apenas Couro
O couro é a pedra angular da indústria portuguesa de calçado. A especialização neste material nobre é uma escolha estratégica que capitaliza as suas propriedades inerentes: durabilidade, conforto, elasticidade, capacidade de respiração e resistência natural.
No entanto, a excelência dos materiais não se limita ao couro. A indústria portuguesa tem inovado na utilização de um portfólio diversificado de componentes de alta qualidade:
- ⟢ Cortiça: Um material natural, intrinsecamente português, a cortiça é extremamente versátil, leve e possui notáveis propriedades de absorção de choque. É frequentemente utilizada em palmilhas e saltos, melhorando significativamente o conforto e acrescentando uma dimensão de sustentabilidade ao produto final.
- ⟢ Borrachas de Alta Tecnologia: Em segmentos como o calçado profissional e de segurança, são utilizadas borrachas técnicas avançadas, como o SEBS (copolímero de estireno-etileno-butileno-estireno), que oferecem elevada resistência a agentes químicos e ao desgaste, garantindo higiene e conforto.
- ⟢ Polímeros Avançados e Materiais Injetados: Para a construção de solas duráveis e especializadas, a indústria recorre a compostos como PVC (policloreto de vinila), PU (poliuretano) e TR (borracha termoplástica), que permitem aliar resistência a design e funcionalidade.

A qualidade estende-se também a componentes que, embora invisíveis ao consumidor, são cruciais para a longevidade e o conforto do calçado. O contraforte, a peça estrutural que envolve o calcanhar, é fundamental para manter a forma do sapato e oferecer estabilidade. Um contraforte de qualidade resiste à deformação mesmo após uso prolongado.
2.2 Engenharia da Longevidade: Uma Análise das Técnicas de Construção
Se os materiais são o vocabulário do calçado, os métodos de construção são a sua gramática. A forma como as diferentes partes de um sapato são unidas determina a sua flexibilidade, resistência à água e, de forma crucial, a sua durabilidade e capacidade de ser reparado. A indústria portuguesa distingue-se pela sua mestria numa vasta gama de técnicas, combinando a precisão artesanal com a eficiência tecnológica.

⟢ Construção Goodyear Welt: Considerada a “alta-costura” da produção de calçado, esta é uma das técnicas mais complexas e duradouras.
⟢ Construção Blake Stitch: Neste método, uma única costura atravessa diretamente a sola exterior, a palmilha de montagem e a gáspea.
⟢ Construção Strobel: Comum em calçado desportivo e casual, esta técnica envolve costurar a gáspea diretamente a uma palmilha de tecido, criando uma espécie de “meia” ou “saco”. Esta unidade é depois colada à sola exterior.
⟢ Outras Técnicas Relevantes: A indústria domina ainda uma variedade de outros métodos que demonstram a sua versatilidade. A Montagem Plana é um dos processos mais comuns e eficientes.
A mestria nestas diversas técnicas permite aos fabricantes portugueses escolher o método de construção mais adequado para a função e o posicionamento de cada sapato, otimizando sempre o equilíbrio entre conforto, estética e, fundamentalmente, durabilidade.
2.3 O Fator Humano: O Valor Insubstituível da Mestria Artesanal
A tecnologia e os materiais de alta qualidade são essenciais, mas o verdadeiro diferencial da indústria portuguesa reside no seu capital humano. O setor foi construído sobre uma “legião de trabalhadores qualificados”, cujo conhecimento prático foi acumulado e transmitido ao longo de gerações.
A intervenção humana qualificada é crítica em várias etapas do processo produtivo. A seleção e o corte do couro, por exemplo, exigem um olho treinado para identificar as melhores partes da pele e para orientar os moldes de forma a maximizar a resistência e a durabilidade do material.


Secção 3: A Tempestade Perfeita: Navegando a Crise Atual da Indústria
Apesar da sua sólida reputação e das suas fundações de qualidade, a indústria portuguesa de calçado enfrenta atualmente um dos períodos mais desafiadores da sua história recente. Esta secção analisa as dificuldades que o setor atravessa, proporcionando um quadro equilibrado e realista que acrescenta credibilidade à narrativa global e sublinha a urgência da sua contínua adaptação.

3.1 Ventos Macroeconómicos Adversos e Contração do Mercado
O ano de 2024 foi descrito pelos líderes do setor como “muito difícil no plano externo”.
3.2 A Situação das PME: Suportando o Peso da Crise
As pequenas e médias empresas (PME) são a espinha dorsal da indústria do calçado em Portugal, constituindo o seu pilar económico e social em muitas comunidades, onde empregam famílias inteiras.
Esta vulnerabilidade das PME expõe uma potencial fratura estratégica dentro do setor. Críticos, como o Sindicato Nacional dos Profissionais da Indústria de Calçado (SNPIC), argumentam que o apoio institucional e os fundos públicos, nomeadamente os provenientes do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), estão a ser desproporcionalmente canalizados para grandes empresas e para projetos de alta tecnologia e “renovação”. Enquanto isso, as PME tradicionais, que sustentam a economia local e o tecido produtivo, sentem-se ignoradas e “deixadas à sua sorte”.

3.3 O Paradoxo do Trabalho: Uma Crise de Competências e Emprego
A situação do mercado de trabalho na indústria do calçado é paradoxal. Durante anos, o setor enfrentou um défice estrutural de mão de obra qualificada. A dificuldade em atrair jovens para as profissões ligadas à produção, muitas vezes vistas como menos atrativas e com remunerações mais baixas em comparação com áreas como o design ou o marketing, era uma preocupação constante.

A crise atual inverteu drasticamente esta realidade. A quebra abrupta de encomendas levou à paragem de fábricas, a falências e a um aumento do desemprego no setor, uma reviravolta chocante em relação à situação de apenas dois anos antes.

Secção 4: A Proposta de Valor: Uma Defesa Económica e Ética
Num mercado saturado de opções de baixo custo e de rápida obsolescência, o calçado português oferece uma alternativa fundamentada na longevidade. Esta secção constrói o argumento central de que, embora o preço de aquisição seja mais elevado, o valor a longo prazo de um produto “Made in Portugal” é superior, tanto do ponto de vista económico para o consumidor como do ponto de vista ético e ambiental.

4.1 O Verdadeiro Custo do Calçado: Aplicando a “Teoria das Botas de Vimes”
Para ilustrar o conceito de custo total de propriedade, a “Teoria das Botas de Vimes”, do autor Terry Pratchett, oferece uma analogia poderosa e pertinente.
O argumento económico é claro: o investimento inicial mais elevado num par de sapatos portugueses de qualidade é amortizado ao longo de uma vida útil muito superior, resultando num custo por utilização significativamente mais baixo. A possibilidade de reparação, especialmente em calçado com construções cosidas como o Goodyear Welt, estende ainda mais este ciclo de vida, uma opção que raramente existe para o calçado de fast fashion, que é tipicamente colado e concebido para não ser reparado.
4.2 O Veredito do Consumidor: Uma Apreciação Crescente pela Qualidade
Os dados sobre o comportamento do consumidor corroboram a aposta da indústria na qualidade. Um estudo realizado pela LIPOR revelou que, para os consumidores portugueses, o conforto é o fator mais importante na decisão de compra, seguido pela preferência por produtos de fabrico nacional.
Testemunhos e avaliações de consumidores reforçam esta perceção. Clientes, tanto nacionais como internacionais, elogiam frequentemente o calçado português pela sua “boa qualidade”, por ser “muito confortável” e por ser feito de “pele verdadeira” com “excelentes acabamentos”.
Esta valorização traduz-se numa disposição para pagar um prémio. Como já mencionado, um estudo demonstrou que a etiqueta “Made in Portugal” por si só já justifica um preço 28% mais elevado aos olhos dos compradores profissionais

4.3 A Durabilidade como a Forma Suprema de Sustentabilidade
Numa era de crescente consciência ambiental, a longevidade emerge como um dos pilares mais autênticos da sustentabilidade. O argumento mais poderoso contra o desperdício não é apenas reciclar, mas sim reduzir a necessidade de substituição. O produto mais sustentável é aquele que não precisa de ser comprado com frequência.
Neste contexto, a durabilidade e a capacidade de reparação do calçado português oferecem uma contranarrativa poderosa ao modelo de negócio da fast fashion, que é intrinsecamente insustentável devido ao seu enorme consumo de recursos e à geração massiva de resíduos têxteis. A própria APICCAPS defende que o calçado em couro é “consideravelmente mais sustentável” precisamente porque tem um “período de vida mais longo”.

A compra de um par de sapatos bem construído, que pode durar uma década ou mais com os devidos cuidados, transforma-se assim numa decisão ambiental consciente e de grande impacto. É uma escolha tangível que o consumidor pode fazer para se afastar da cultura do descartável.
No entanto, é crucial notar um paradoxo revelado pela investigação: apesar do forte investimento da indústria em sustentabilidade, o estudo da LIPOR concluiu que a “sustentabilidade e o ecodesign são os fatores menos influentes na decisão de compra” para o consumidor médio.

Secção 5: Forjar o Futuro: A Inovação como Pedra Angular da Resiliência
Perante os desafios atuais, a indústria portuguesa de calçado não está passiva. Pelo contrário, está a executar uma estratégia ambiciosa e multifacetada para garantir a sua relevância e competitividade futuras. Esta secção explora como o setor está a investir ativamente na inovação, na sustentabilidade e num reposicionamento estratégico para ascender na cadeia de valor, transformando os desafios de hoje nas oportunidades de amanhã.
5.1 A Revolução Verde: BioShoes4All e a Economia Circular
No centro da visão de futuro da indústria está o projeto BioShoes4All, a sua iniciativa emblemática de sustentabilidade. Trata-se de um investimento massivo, superior a 60 milhões de euros, que envolve 70 parceiros, incluindo empresas, universidades e centros tecnológicos, e é cofinanciado pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
O projeto assenta em cinco pilares estratégicos: Biomateriais, Calçado Ecológico, Economia Circular, Tecnologias de Produção Avançadas e Capacitação/Promoção.
Os resultados concretos já começam a surgir, demonstrando que esta não é uma visão abstrata, mas uma transformação tangível:
⟢ Novos Biomateriais: Resíduos agrícolas e industriais, como caroços de azeitona, cascas de laranja, podas de videira e borras de café, estão a ser transformados em novos materiais biológicos para componentes de calçado.
⟢ Alternativas ao Couro: Já foram desenvolvidas 24 “biopeles” e 26 “biofibras”, oferecendo alternativas sustentáveis aos materiais convencionais.
⟢ Inovação em Solas: Um dos resultados mais notáveis é o BioCir®flex, uma sola totalmente compostável desenvolvida em parceria entre a empresa Balena e o Grupo Procalçado, ilustrando o potencial para substituir componentes sintéticos por alternativas naturais e biodegradáveis.

Este investimento maciço em I&D sustentável representa uma tentativa estratégica de construir uma nova vantagem competitiva. Tendo sido forçada a abandonar o mercado de baixo custo pela concorrência asiática, a indústria construiu a sua resiliência com base na qualidade. Agora que essa posição premium está sob pressão devido ao aumento dos custos, a nova estratégia passa por criar uma nova barreira à entrada, desta vez baseada em tecnologia sustentável de ponta e proprietária. Se Portugal se conseguir estabelecer como o líder mundial em calçado de alta qualidade e de economia circular, criará uma proposta de valor única que justifica um preço mais elevado e que não pode ser facilmente replicada por produtores em massa.
Iniciativas paralelas, como o projeto FAIST (Fábrica Ágil, Inteligente, Sustentável e Tecnológica), complementam esta visão, focando-se na digitalização e automação dos processos produtivos para aumentar a eficiência, a agilidade e a sustentabilidade da base industrial.

5.2 O Imperativo Estratégico: Ascender na Cadeia de Valor
A análise económica é inequívoca: com os custos de produção a aumentar e os preços de venda a estagnar, o modelo de negócio “premium”, que serviu a indústria tão bem nas últimas duas décadas, está a chegar a um ponto de saturação. Como aponta o especialista Miguel Cardoso Pinto, o setor está a entrar num “novo ciclo” que exige um reposicionamento estratégico para capturar maior valor.
O caminho delineado é uma ascensão do segmento premium para o de luxo. Esta transição implica mais do que apenas fabricar um produto de alta qualidade; exige excelência em toda a cadeia de valor, incluindo design original, construção de marca, marketing sofisticado e uma experiência de cliente excecional.
Um exemplo paradigmático deste potencial é o do empresário e designer Carlos Santos. Descrito como o “único fabricante português de calçado topo de gama”, a sua marca compete diretamente com as melhores do mundo.
Esta dupla aposta — na sustentabilidade de vanguarda e no luxo artesanal — indica um reconhecimento estratégico de que o futuro da indústria não reside no volume, mas sim na dominação de nichos de alto valor. As competências intrínsecas do setor, como a flexibilidade, a capacidade de produção em pequenas séries e a elevada qualificação da mão de obra, estão perfeitamente alinhadas com as exigências destes mercados especializados.
5.3 Comunicar a Mensagem de Valor
A concretização desta visão de futuro depende da capacidade de comunicar eficazmente a nova proposta de valor nos mercados internacionais. A estratégia de marketing da indústria, liderada pela APICCAPS, é dupla: por um lado, defender e reforçar a quota de mercado nos seus bastiões europeus; por outro, prosseguir a diversificação geográfica para mercados com elevado potencial de crescimento.
As táticas são integradas e abrangem um vasto leque de ações:
⟢ Presença em Feiras Internacionais: A participação em eventos de referência, como a MICAM em Milão, continua a ser uma ferramenta crucial para contactar com compradores e apresentar novas coleções.
⟢ Marketing Digital e Relações Públicas: Utilização de portais online, campanhas de marketing de conteúdos, assessoria de imprensa e publicidade em publicações de prestígio para construir a imagem de marca “Portuguese Shoes”.
⟢ Apoio à Internacionalização: Programas como o “SHOES FOR INTERNATIONAL MARKETS”, desenvolvido em parceria com o Centro Tecnológico do Calçado de Portugal (CTCP), oferecem apoio direto às empresas na elaboração de planos estratégicos e de marketing para a sua internacionalização, ajudando-as a transformar a excelência produtiva em sucesso comercial e de marca.

O desafio é claro: traduzir a inovação tecnológica e a mestria artesanal numa história de marca convincente que ressoe junto do consumidor final e justifique o posicionamento de alto valor do produto.
Conclusão
A indústria portuguesa de calçado encontra-se numa encruzilhada. A confluência de um abrandamento económico global, o aumento dos custos de produção e a intensificação da concorrência criou uma “tempestade perfeita” que testa a sua resiliência de uma forma que não se via há décadas. A crise é real, como evidenciado pela queda do valor das exportações e pelo aumento preocupante das insolvências, especialmente entre as PME que formam o tecido vital do setor.
No entanto, este relatório demonstra que a indústria possui os ativos fundamentais não só para sobreviver, mas para emergir mais forte. A sua história é um testemunho da sua capacidade de se reinventar perante a adversidade, transformando crises em catalisadores para a inovação. Os pilares que sustentam a sua reputação global — materiais de qualidade superior, mestria em técnicas de construção que garantem a durabilidade e uma força de trabalho qualificada — continuam a ser as suas maiores vantagens competitivas.
A estratégia delineada para o futuro, assente num duplo pilar de sustentabilidade de vanguarda e de uma ascensão para o segmento de luxo, é a resposta lógica e ambiciosa aos desafios atuais. O projeto BioShoes4All não é apenas um investimento em tecnologia “verde”; é uma tentativa de redefinir o paradigma da indústria, criando uma nova proposta de valor baseada na economia circular que a diferencia fundamentalmente da concorrência.
Para o consumidor, a mensagem é mais pertinente do que nunca. Num mundo a afogar-se nos resíduos da fast fashion, a escolha de um par de sapatos portugueses transcende a mera aquisição. É um investimento económico inteligente, baseado no princípio do custo total de propriedade, onde a durabilidade se traduz em poupança a longo prazo. É também uma declaração ética, um voto por um modelo de produção que valoriza a qualidade sobre a quantidade, o artesanato sobre a automação anónima e a longevidade sobre o descartável.
Embora os desafios macroeconómicos sejam formidáveis e a transição estratégica exija um esforço concertado de todas as partes interessadas, as fundações da indústria portuguesa de calçado permanecem sólidas. O seu compromisso intrínseco com a produção de bens duradouros e de alta qualidade não é apenas um vestígio do seu legado; é o seu ativo mais valioso e a sua promessa mais convincente para um futuro resiliente e sustentável.